Seis poemas from O martelo
Written in Portuguese by Adelaide Ivànova
o gato
a delegada não me levou a sério
em nada e perguntou escorregadia
se eu queria mesmo que se
instaurasse inquérito vestia um
conjuntinho maravilhoso e
horroroso calça e camisa
jeans com jeans
depois ao ler o processo
a delegada me fez lembrar de janus
o rei romano com duas caras e
do gato com duas caras que
morreu aos 15 anos
uma raridade um gato assim viver tanto
já a delegada segue viva de conjuntinho
jeans com janus.
a porca
a escrivã é uma pessoa
e está curiosa como são
curiosas as pessoas
pergunta-me por que bebi
tanto não respondi mas sei
que a gente bebe pra morrer
sem ter que morrer muito
pergunta-me por que não
gritei já que não estava
amordaçada não respondi mas sei
que já se nasce com a mordaça
a escrivã de camisa branca
engomada
é excelente funcionária e
datilógrafa me lembra muito
uma música
um animal não lembro qual.
o urubu
corpo de delito é
a expressão usada
para os casos de
infração em que há
no local marcas do evento
infracional
fazendo do corpo
um lugar e de delito
um adjetivo o exame
consiste em ver e ser
visto (festas também
consistem disso)
deitada numa maca com
quatro médicos ao meu redor
conversando ao mesmo tempo
sobre mucosas a greve
a falta de copos descartáveis
e decidindo diante de minhas pernas
abertas se depois do
expediente iam todos pro bar
o doutor do instituto
de medicina legal escreveu seu laudo
sem olhar pra minha cara
e falando no celular
eu e o doutor temos um corpo
e pelo menos outra coisa em comum:
adoramos telefonar e ir pro bar
o doutor é uma pessoa
lida com mortos e mulheres vivas
(que ele chama de peças)
com coisas.
os testículos
em alemão visor de porta
é espião olho mágico em
português peephole é o
que se diz no paquistão
cuja língua oficial é o
inglês judas é a palavra
em francês aproximando
a vigilância da traição
o que me parece fruto
de resignada sensatez
as testemunhas não são
traças não viram nada como
viram as traças mas defendem
com histeria a inocência do
príncipe usando-me a mim
como medida como podem
ser chamadas de testemunhas
testemunhas que não viram nada
antes não se faziam as coisas
por medo da guilhotina hoje
apenas pelo medo de ser
pego no flagra
(no paquistão se a vítima
não encontrar quatro testemunhas
oculares é ela que será
processada na inglaterra do
século 18 se a vítima não
tivesse gritado e se debatido
se estabelecia que a denúncia
não valia)
as testemunhas inventaram
parentescos amizades um padrasto
listaram relações imaginárias e
que fui ter com o príncipe
em seu quarto está tudo nos autos
palavras tantas entram em
mítica instância viram
documento poema oficial
mas incompetente as testemunhas
todas sabem que mentem
o que elas
não sabem é que em latim
testemunhas e testículos
advêm da mesma base o que nesse
caso é um insulto com os testículos
essa coisa tão maravilhosa
que são os testículos
testis é o nome em latim
de onde dizem se inspirou
valéry para dar ao monsieur
o nome de teste que Humboldt
me mandou ler e como Humboldt
tem belos testículos faço tudo
que ele pede as testemunhas
todas mentem não dizem nada
com nada e se consideram
estupro sexo é porque não
fazem ideia como eu faço
do que é uma bela trepada.
a sentença
duas releituras de duas odes de ricardo reis
I
pesa o decreto atroz, o fim certeiro.
pesa a sentença igual do juiz iníquo.
pesa como bigorna em minhas costas:
um homem foi hoje absolvido.
se a justiça é cega, só o xampu é neutro:
quão pouca diferença na inocência
do homem e das hienas. deixem-me em paz!
antes encham-me de vinho
a taça, qu’inda que bem ruim me deixe
ébria, console-me a alcoólica amnésia
e olvide o que de fato é tal sentença:
a mulher é a culpada.
II
pese do fiel juiz igual sentença
em cada pobre homem, que não há motivo
para tanto. não fiz mal nenhum à mulher e
foi grande meu espanto
quando ela se ofendeu. exagerada, agora
reclama, fez denúncia e drama, mas na hora
nem se mexeu. culpa é dela: encheu à brava
a garbosa cara.
se a justiça é cega, só a toupeira é sábia.
celebro abonançado o evidente indulto
pois sou apenas homem, não um monstro! leixai
à mulher o trauma.
o martelo
o papa quando morre
leva uma
marteladinha
na testa eu nunca
martelei
ninguém
nem papa nem príncipe nem rei
quando a procissão
tem que seguir
o capataz dá três
marteladas
no andor e os
costaleiros seguem
martelo
é um decassílabo heroico
com tônicas nas posições
três seis e dez quando
o atleta termina o
molinete três voltinhas
em torno de si mesmo
pode lançar o
martelo
que pesa sete kilos
duzentos e sessenta gramas
marx nunca falou sobre
martelo
algum quem já viu
escola de pensamento ter
símbolo qual seria o símbolo
da escola de frankfurt se
adorno tivesse escolhido um?
quando thor bate seu
martelo
é sinal de chuva e trovão
mas é a flor do mandacaru
que anuncia chuva no
sertão para o tubarão-martelo o
martelo
funciona como uma asa
estabilizando seus
movimentos além disso
o ritual de acasalamento
dos tubarões-martelo
é muito violento
na bandeira da albânia
comunista substituíram o
martelo
por um fuzil o
martelo
é um objeto ótimo
que serve pra dormir bem
ou pregar pregos.
Published May 19, 2019
Excerpted from Adelaide Ivànova, O martelo, Garupa, Rio de Janeiro, 2017.
© Adelaide Ivànova 2017
© Garupa 2017
Six Poems from The Hammer
Written in Portuguese by Adelaide Ivànova
Translated into English by Chris Daniels
the cat
the official didn’t take me seriously
in the least and she asked me all slick
did i really want to open
an investigation she was wearing a
wonderfully awful outfit
pants and blouse
jeans on jeans
after reading through the papers
the official made me think of janus
the roman king with two faces and
the cat with two faces who
died at 15 it’s rare
for a cat like that to live so long
yet the official lives on in her little outfit
jeans on janus.
the sow
the clerk is a person
and she’s curious just
like all persons are curious
she asks me why i drank so
much i don’t answer but i
know people drink to die
only not to die a lot
she asks me why didn’t i
scream since i wasn’t
gagged i don’t answer but i know
we’re all born with the gag
the clerk in her starched
white shirt
is an excellent officer and
typist she reminds me so much
of a song
of an animal i can’t remember which.
the vulture
corpus delicti is
the expression used
when law is breached and
traces of the fact of a crime
are left making body a
place and of the crime an
adjective the examination
consists of seeing and being
seen (parties also
consist of these)
lying on a gurney with
four doctors around me talking
about mucous membranes the strike
the lack of disposable cups
and deciding in front of my open
legs if after work should they
all go to the bar or what?
the doctor from the institute
of legal medicine wrote his report
not looking at my face
talking on his cell phone
me and the doctor have a body
and at least two other things in common:
we both love talking on the phone
and going to the bar
the doctor is a person
he deals with dead bodies
and living women
(he calls them pieces of
evidence).
the testicles
in german door viewer
is spy in portuguese
magic eye peephole
is what they say in pakistan
whose official language is
english judas is the word
in france approximating
watchfulness over betrayal
which seems to me the fruit
of resigned wisdom
witnesses are not
moths they saw nothing like
moths yet they defend
hysterically the innocence of the
prince using me
as measure how can
witnesses be called
witnesses if they were never there
before things weren’t done for
fear of the guillotine today
just for fear of being
caught in the act
(in pakistan if the victim
can’t find four eyewitnesses
it is she who will go
to trial in england in the
xviii century if the victim
didn’t scream and struggle
the accusation was found to
be invalid)
the witnesses invented
kinships friendships they claimed
imaginary relations a stepfather
and how it was me who went to the prince
in his chambers it’s all in the records
so many words enter into
a mythical instance become
document poem official
but incompetent the witnesses
all know they lie what they don’t
know is that in latin
witnesses and testicles
come from the same root which in this
case is an insult to testicles
such wondrous things they
are the testicles
testis is the latin name
which they say inspired
valèry to give his monsieur
the surname teste that Humboldt
told me to read and since Humboldt
has the most gorgeous testicles i do
all he asks the witnesses
all lie they say nothing
about anything and if they think
rape is sex it’s because
they have no idea like me
just how lovely a fuck can be.
the sentence
a re-reading of two odes by ricardo reis
I
weighs hard the cruel decree, the managed end.
weighs hard the sentence lawless as the judge.
weighs hard this crushing anvil on my shoulders:
today a man was acquitted.
if justice be blind, then only shampoo is neutral:
how small the difference between the innocence
of men and hyenas. o hell just let me be! or
better, fill with wine
my cup, which, while so wicked, yet will make
me drunk, alcohol’s amnesia console me,
and i forget what such sentencing means: woman,
the eternal guilty party.
II
weigh well this righteous sentence from a loyal judge
upon all poor men: she can have no motive.
i did the woman no physical harm and thus
great was my surprise
when she took offence. exaggerant, she now
denounces, dramatizes, but at the time she did
not so. hers the fault: that brave and handsome
face you see was beastly drunk.
if justice be blind, why then, weasel, be wise:
in peaceful weal i celebrate my manifest
pardon, for i am a man, not a monster!
such women deserve their “trauma”.
the hammer
when the pope dies
he gets a little
silver tap
on the forehead i never
hammered
anyone
not pope not prince not king
when the procession
has to start
the carlemengo taps
three times
on the litter and the
bearers carry on
hammer
is the name of a
kind of heroic decasyllable
with hard stresses at
the third sixth and tenth
positions when the
athlete ends the
wind-up his three
pirouettes he
can let go of the
hammer
it weighs seven kilos
two hundred sixty grams
marx never talked about a
hammer
at all you ever hear of a
school of thought with a
symbol what would be the symbol
of the frankfurt school if
adorno had chosen one?
when thor strikes with his
hammer
it’s the sign of rain and thunder
but the mandacaru flower
says it’s going to rain in the
sertão for the hammerhead shark the
hammer
functions like a wing
and stabilizes its
movements and besides that
the mating ritual
of the hammerhead shark
is very violent
in socialist albania
they replaced the
hammer
with a rifle the
hammer
is a magnificent object
it helps you sleep well
or pull a nail.
Published May 19, 2019
Excerpted from Adelaide Ivànova, The Hammer, Commune Editions 2019
© Adelaide Ivànova 2017
© Commune Editions 2019
Sei poesie from Il martello
Written in Portuguese by Adelaide Ivànova
Translated into Italian by Prisca Agustoni
il gatto
la delegata non mi prese per nulla
sul serio e chiese di striscio
se volessi proprio
che si avviasse un’indagine indossava
un completino meraviglioso e
orribili pantaloni e camicia
jeans con jeans
poi nel leggere il processo
la delegata mi ricordò giano
il re romano dalle due facce
e il gatto dalle due facce che
morì a 15 anni
una rarità vivere tanto per un gatto
la delegata invece è ancora viva nel completino
jeans con giano
la maiala
l’impiegata è una persona
ed è curiosa come sono
curiose le persone
mi chiede perché ho bevuto
tanto non ho risposto ma so
che si beve per morire
senza dover morire molto
mi chiede perché non ho
gridato visto che non ero
imbavagliata non ho risposto ma so
che si nasce già con il bavaglio
l’impiegata dalla camicia bianca
inamidata
è un’eccellente funzionaria e
dattilografa mi ricorda molto
una musica
un animale non ricordo quale.
l’avvoltoio
corpo del reat sarebbe
l’espressione usata
per i casi di
violazione in cui
le tracce dell’evento
sono localizzate
facendo del corpo
un luogo e del reato
un aggettivo l’esame
consiste nel vedere ed essere
visto (anche le feste
consistono in questo)
sdraiata in un lettino con
quattro medici attorno a me
discorrendo tutti insieme
di mucose dello sciopero
della mancanza di bicchierini di plastica
e decidendo davanti alle mie gambe
aperte se dopo il lavoro
sarebbero andati tutti al bar
il dottore dell’istituto
di medicina legale scrisse il suo referto
senza guardarmi in faccia
e parlando al cellulare
io e il medico abbiamo un corpo
e per lo meno un’altra cosa in comune:
ci piace telefonare e andare al bar
il dottore è una persona
ha a che fare con morti e con donne vive
(che lui chiama pezzi)
con cose.
i testicoli
in tedesco lo spioncino
è spia occhio magico in
portoghese peephole è come
si dice in pakistan
la cui lingua ufficiale
è l’inglese giuda è la parola
in francese che avvicina
la sorveglianza al tradimento
il che mi sembra frutto
di rassegnato buonsenso
i testimoni non sono
falene non videro nulla come
lo videro le falene ma difendono
con isteria l’innocenza
del principe servendosi di me
come misura come possono
essere chiamati testimoni
i testimoni che non videro nulla
un tempo non si facevano le cose
per paura della ghigliottina oggi
solo per paura di essere
colti in flagrante
(nel pakistan se la vittima
non trova quattro testimoni
oculari sarà lei che verrà
processata nell’inghilterra del
diciottesimo secolo se la vittima
non avesse gridato dimenandosi
si stabiliva che la denuncia
non valeva)
i testimoni inventarono
parentele amicizie un patrigno
citarono relazioni immaginarie e
che m’incontrai con il principe
nella sua stanza è tutto nella perizia
tante parole entrano in
mitica istanza diventano
documento poesia ufficiale
ma incompetente tutti i testimoni
lo sanno che mentono
ciò che non
sanno è che in latino
testimoni e testicoli
derivano dalla stessa radice e che in
questo caso è un insulto ai testicoli
questa cosa così meravigliosa
che sono i testicoli
testis è il nome latino
dal quale dicono si ispirò
valéry per dare al monsieur
il nome di teste che Humboldt
mi ordinò di leggere e siccome Humboldt
ha dei bei testicoli faccio tutto
quello che chiede tutti i
testimoni mentono non dicono
un cavolo e se considerano
che lo stupro sia sesso è perché
a differenza di me non hanno
idea di cosa sia
una bella scopata.
la sentenza
due riletture di due odi di ricardo reis
I.
pesa il decreto atroce, la fine sicura.
pesa l’identica sentenza del giudice iniquo.
pesa come un’incudine sulla mia schiena:
oggi un uomo è stato assolto.
se la giustizia è cieca, solo lo shampoo è neutro:
così poca differenza tra innocenza
dell’uomo e delle iene. Lasciatemi in pace!
prima, riempitemi di vino
il calice, che pur se cattivo mi lasci
sbronza, mi consoli l’alcolica amnesia
e dimentichi ciò che la sentenza dice:
la donna è la colpevole.
II.
pesi del giudice fedel la stessa sentenza
su ogni pover’uomo, dato che non c’è motivo
per la condanna: non ho fatto del male alla donna
e fu enorme il mio spavento
quando s’è offesa. esagerata, adesso
si lamenta, denuncia e un dramma, ma allora
non si mosse. è sua la colpa: di cachaça
si è ubriacata.
se la giustizia è cieca, solo la talpa è saggia.
festeggio pacato l’evidente perdono
perché sono solo un uomo, non un mostro!
lasciate alla donna il trauma.
il martello
al papa quando muore
si dà
una martellatina
in testa io non ho mai
martellato
nessuno
né un papa né un principe né un re
quando la processione
deve continuare
il capo dà tre
martellate
al fercolo
e i portatori proseguono
martello
è un decasillabo eroico
con l’accento di
terza sesta e decima quando
l’atleta finisce
il mulinello tre giravolte
su se stesso
può lanciare
il martello
che pesa sette chili
duecentosettanta grammi
marx non ha mai menzionato
nessun martello
chi ha mai visto
una scuola di pensiero con
un simbolo quale sarebbe il simbolo
della scuola di francoforte se
adorno ne avesse scelto uno?
quando thor batte il suo
martello
è segno di pioggia e tuoni
ma è il fiore del mandacaru
che annuncia la pioggia nel
sertão per lo squalo martello il
martello
funziona come un’ala
stabilizzando i suoi
movimenti inoltre
il rituale di accoppiamento
degli squali martello
è molto violento
nella bandiera dell’albania
comunista sostituirono
il martello
con un fucile il
martello
è un ottimo oggetto
che serve per dormire bene
o piantare chiodi.
Published May 19, 2019
© Adelaide Ivànova 2017
© Babel Festival 2018
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